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Entrelinhas de Mulher

Tirem a comida do leão!


Tirem a comida do leão

Tina e Zaurus eram os mais novos reis da savana africana. Apaixonados, celebraram sua união em meio aos amigos, sob a benção dos pais e dos deuses.
O macaco Phynus, o celebrante, falou sobre a vida, o amor, as conquistas, os ancestrais e as novas gerações!
A festa correu solta pela noite adentro! Todos comemoravam com o jovem casal que tinha uma vida pela frente e um reino inteiro para governar.

Fonte: Visual Hunt

A vida seguiu célere.
Zaurus protegia os domínios do reino com justiça, ética e bravura com Zina ao seu lado! Ambos caçavam, ajudam os idosos, tomavam decisões juntos e se revezavam nas atividades reais.
Havia um equilíbrio perfeito!
Quando Tina anunciou a chegada do herdeiro, nova festa se fez! Uma festividade que brindava os ciclos da vida!
Solis nasceu em um dia quente e ensolarado. Acolhido amorosamente pelos pais e familiares era o leãozinho mais fofo do universo.
Tina sentiu a maternidade correndo pelas veias… Forte e pulsante. Um sentimento único, nunca vivenciado anteriormente… A expressão “mato e morro por ele” brotou em seu coração.
Amor forte e intenso. Amor de mãe!
Zaurus chorou de orgulho e emoção: um misto de sensações boas! Assumiu consigo mesmo o compromisso de ser um pai para Solis ainda melhor do que seu próprio pai havia sido com ele.
Amor forte e intenso. Amor de pai!
Solis cresceu em graça e sossego, com uma proteção excessiva dos genitores! Não podia ir à savana no inverno porque não havia o que caçar. Não podia ir à savana no verão porque era apenas um filhote indefeso – presa fácil para os predadores. Sua mãe caçava dobrado, todos os dias, para alimentá-lo.
Na adolescência, como não ia a savana, não tinha amigos da sua idade e seu passatempo era jogar pedras com o sacerdote Phynus.
Tina percebia que havia algo de diferente com o filho mas dizia para si mesma que quando ele crescesse, tudo se resolveria.
Zaurus percebia que havia algo de diferente com o filho mas não queria contrariar Tina…

Fonte: Visual Hunt

A vida seguiu célere…
Solis era um leão adulto, forte, sadio, mas extremamente acomodado. Acordava para almoçar a caça amorosamente trazida por sua mãe, depois voltava para descansar mais um pouco… No final da tarde se arrastava até a ponta da grande pedra para ver o pôr do sol e ficava lá até altas horas rindo das piadas das hienas.
Tina percebeu que Solis cresceu e nada se resolveu.
Zaurus percebeu que deveria ter contrariado Tina.

Tudo fez um triste sentido

Tina e Zaurus resolveram se aconselhar com Phynus. Abriram o coração para o macaco-sacerdote, compartilhando seus medos e dúvidas.
Phynus sorriu e disse: “tem jeito, meus amigos! Tirem a comida do leão!”.
Tina e Zaurus se entreolharam assustados exclamaram: “COMO ASSIM PHYNUS? Vamos deixar nosso filho morrer de fome?”.
Ele gargalhou e depois respondeu: “Não! A principal habilidade de um leão é caçar! E Solis precisa saber que é capaz de caçar! Precisa se perceber leão! E deixando de dar a comida na boquinha dele, vocês vão permitir que ele entenda que pode comer por si só!”.
O semblante daqueles pais mostrava um misto de sensações: medo, dúvida e falta de entendimento…
Phynus continuou: “Amigos, eu acompanhei de perto o crescimento de Solis! Em nome do amor, vocês nunca permitiram que ele experimentasse a vida, que ele errasse ou que descobrisse suas potencialidades. Ao fazerem tudo por ele, ensinaram que ele é incapaz e fraco!
E para propiciar o maior ensinamento que vocês podem dar a ele – descobrir suas potencialidades – vocês devem, finalmente, deixá-lo viver por conta própria! E isso começa pelo instinto da caça! Pela busca pela comida! Tirem a comida desse leão!
Quando ele sentir fome, vai se obrigar a ir a savana caçar! Vai errar, vai demorar dias para conseguir um alimento e sentirá mais fome ainda! Mas quando conseguir, descobrirá quem é de verdade: o príncipe da selva!”.

Tina e Zaurus saíram dali arrasados… Tudo fazia um triste sentido. Como haviam errado com Solis. Como ele sofreria para aprender, em dias, o que eles poderiam ter ensinado em uma vida inteira.

Mas, antes tarde do que nunca! Tina e Zaurus planejaram uma viagem de 3 meses para o interior da savana. Uma viagem para tratar de assuntos dos súditos que lá habitavam. Instruíram os demais membros da tribo sobre a conduta nas suas ausências: cada um caça por si e todos defendem o reino.
Solis escutou aquilo tudo e não entendeu muito bem… Ele não se viu mencionado nos planos da viagem nem escutou orientações dos pais sobre sua alimentação às leoas do grupo.
Curioso, foi ter com os pais: “e ai velhos, quem vai cuidar do meu rango?”.
Tina foi firme, falou sorrindo com os lábios, aparentando uma calma que estava longe de sentir: “Você filho. Com seu porte e sua idade você dá conta de caçar seu almoço sem problemas!”.
Solis rugiu alto pela primeira vez: “Tá maluca mãe? Nunca cacei na vida!”.

Fonte: Visual Hunt

Zaurus, até então em silêncio, comunicou: “Será uma ótima oportunidade de aprender! Confiamos em você!”. Abraçaram o filho atônito e partiram.
Naquele momento, Solis declarou-se vegetariano. Afinal, quem precisava de carne mesmo?!
Por dois dias foi até a entrada da savana e colheu dezenas de frutinhos vermelhos para se alimentar. Orgulhoso de si mesmo, acreditou que estava com a vida resolvida até os pais voltarem!
No terceiro dia a fome falou alto. Solis se sentiu inquieto e irritado.
Foi até a savana e por mais que comesse as frutinhas, a fome gritava. Percebeu-se encurralado! Teria que entrar na savana se quisesse comer!
E foi! Encantou-se com a beleza do lugar e se perguntou porque nunca entrara mata adentro.
Foi indo sem rumo certo, seguindo, pela primeira vez, a voz do seu próprio coração.
Passou um mês embrenhado na mata. Machucou as patas, quase caiu numa ribanceira, fez novos amigos e sim, caçou! Alimentou-se pelas próprias patas e aprendeu muito sobre si mesmo: ele era Solis, o leão da savana.

O retorno dos pais

Tina chorou por quase um mês apoiada em Zaurus até que as primeiras notícias do sucesso de Solis começaram a chegar! Como ele estava dando conta do recado, o casal começou a aproveitar a viagem e curtir a companhia um do outro como há anos não faziam.
Quando retornaram ao reino, um milagre havia acontecido! Solis empoderou-se! Tomou posse de si mesmo, trazendo para a consciência e a para a ação todas as suas habilidades leoninas! Além de reger o reino na ausência dos pais, havia aberto uma escolinha de caça para leões, para que a tarefa de educar pudesse ser compartilhada entre todos!
Havia encontrado uma parceira querida, Pairas e seu sorriso revelava sua felicidade!
Tina e Zaurus choraram de emoção e felicidade junto a Solis. Agradeceram aos deuses por terem tido a coragem de mudar enquanto havia tempo! Agradeceram por terem tido coragem de confiar na vida! Agradeceram por terem, finalmente, acreditado no filho e dado a ele oportunidade de viver em plenitude!
A vida seguiu célere!
Pairas e Solis se casaram para a alegria de seus pais. E meses depois, Pairas anunciou a chegada de uma herdeira!
O reino foi ao delírio! Phynus, mais tarde, foi cumprimentar os novos pais e declarou: “Parabéns pela princesa Nayra! E já sabem: tirem a comida dessa leoazinha!”.
Todos riram, mas nos seus corações, sabiam sobre a importância de se educar para a autonomia e a independência!

http://www.flickr.com/photos/martin_heigan

 

 

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